Será possível ser-se extremamente badalhoco – a um ponto que roça o incomodativo – e mesmo assim escrever-se de uma maneira genial? A resposta é sim, mas só se formos Michel Houellebceq.
Este é o segundo livro que conheço do autor e devo admitir
que o primeiro que li – O Mapa e o Território (2010) – não me preparou para o
que se me ia seguir. Há quem diga que este romance provocou tamanho escândalo, aquando da sua publicação em 1998, que Houellebecq, consciente das necessidades de alargar o seu público-alvo,
adoptou de seguida um tom mais puritano, como estratégia para o prémio Goncourt
(o mais importante premio francês), que acabou por ganhar. Embora estas
especulações me pareçam artisticamente calculistas, não pude deixar de
encontrar um pequeno fundamento para as mesmas ao ler As Partículas Elementares
(1998). Mergulhamos numa aventura sem retorno pontuada de acontecimentos
catastróficos e uma listagem das várias maneiras de masturbação pública
possíveis. Fica-se preso assim entre um querer atirar com o livro para a
retrete e um não conseguir deixar de o devorar, que só as obras geniais
conseguem.
A dimensão psicológica das personagens é-nos explanada
segundo um processo de dissecação emocional, que se relaciona com o facto de
uma delas ser um biólogo investigador; mas cuja plena razão de ser apenas nos é
dada a perceber mais tarde, no epílogo. Tem, de facto, um dos melhores finais
que já li. É um daqueles livros em que se percebe que o mesmo foi pensado
durante todo o processo da escrita, se é que não foi a própria razão da mesma.
Bruno e Michel são dois irmãos cuja vida falhou, mas, como o
autor no-lo dá a entender, o mesmo se passa com cada um de nós. É um relato
frio e estranho, completamente diferente de O Mapa e o Território, mas
semelhante na medida da sua análise da inevitável solidão humana. O germe do
desligamento sentimental explode aqui em toda a força e ninguém é poupado. Para
ler com whisky e Água das Pedras (estes podem, dependendo das alturas, ser
utilizados em conjunto ou separadamente).