sábado, 2 de abril de 2011

Aló, presidente? Sí, presidente.

E eis que a controvérsia atinge de novo este pais tropical à beira das Caraíbas plantado. Imenso e contrastado são dois adjectivos que tanto servem para descrevê-lo a si, como ao seu líder. A Universidade de La Plata, na Argentina, decidiu atribuir um prémio para a liberdade de imprensa ao Presidente da Venezuela Hugo Chávez. Assim o foi, pelo seu “contributo para a comunicação popular”, por “desmontar os monopólios mediáticos vigentes” e pelo seu “inquestionável compromisso na defesa da liberdade do seu povo, na consolidação da unidade latino-americana e na promoção dos direitos humanos e valores democráticos”.

Afirma Bart Jones, jornalista e biógrafo, que a principal razão que o levou a escrever um livro sobre este homem foi a de que a sua vida parecia ter “saído directamente de um filme de Hollywood”. Se bem que o mesmo fosse capaz de não apreciar a analogia, ela não perde por isso o fundamento.
Este líder controverso e polémico, amado por uns e detestado por outros, veio de uma humilde região dos Llanos, tendo passado os seus primeiros anos a viver numa cabana feita de adobe. Seguiu posteriormente carreira na Academia Militar, onde conspirou contra o poder vigente. Na altura do governo de Carlos Andrés Perez, a miséria, a inflação e o desemprego eram incomportáveis; e as riquezas provenientes do petróleo, essas, concentravam-se exclusivamente numa pequena elite. A gota de água foi sem dúvida o Caracazo, uma revolta popular reprimida sangrentamente. Um golpe militar falhado em 92, que o levou à prisão, fez então de Chávez algo parecido com um herói.
Enquanto presidente, continuou ainda a ter inimigos muito poderosos entre as classes dominantes; e sem dúvida fosse essa a explicação para algumas das suas medidas mais extremas. *

Quem o ouvisse falar, nos primeiros anos do seu governo, achá-lo-ia possuído por alguma sorte de feitiço, uma energia mágica expressa através das simples palavras. A sua capacidade de mover massas, sobretudo entre os mais pobres, é ainda hoje aquilo em que reside o seu poder.
Incorreu, porém, naquele que penso ser o artificio fatal para alguém tão extremo e provocador: tornou-se numa caricatura de si próprio, o personagem central de um gigantesco circo de demagogia, populismo, e culto da personalidade. Fugindo ao debate critico de uma sociedade democrática, rodeou-se de um bando de temerosas figuras que aquiescem a qualquer decisão sua, e se deixam responsabilizar por todas as falhas no sistema, sob pena de verem as respectivas carreiras ir por água abaixo. A revolução socialista, que tanto preconizava, não logrou pôr em prática algumas das suas mais importantes reformas. Os seus discursos transformaram-se em desesperadas chorrilhos de chavões anti-imperialistas, tão confusos e generalistas que podiam ser copiados ao infinito e aplicados a qualquer situação.
O medo da oposição levou-o a crer que alguns fins justificavam certos meios. E assim esse pavor se revelou na criação da um one man show de cinco horas na televisão estatal, transmitido todos os Domingos, em que o protagonista/herói é ele próprio. Mas também no encerramento de inúmeros postos de rádio e canais de televisão por cabo; assim como outros tipos de censura, como propostas de restrições às mensagens publicadas nas redes sociais.

Tal como diz John Dines, professor da Escola de Jornalismo da Universidade de Columbia, este prémio revela, acima de tudo, ideias diferentes sobre a liberdade de imprensa na América Latina. Eu acrescentaria que estamos perante uma perspectiva ambivalente, em que os dois lados da moeda merecem ser analisados. Considero, porém, que este prémio já teve mais razão de ser em outros tempos do que agora.


*A propósito do fecho da estação televisiva RCTV, veja-se como a informação passada nos media pode por vezes dar azo à contra-informação,emhttp://venezuelanalysis.com/analysis/2221

1 comentário: