domingo, 1 de abril de 2012

O sítio

Lembro-me da primeira vez em que vim aqui. De como esperei de mãos nos joelhos, naquela recepção vazia, escrutinando as revistas à espera que elas me dessem respostas. Tentando parecer o mais natural possível. Cada vez que alguém passava: é conhecido, de certeza. Deve ser um autor de renome, essa pessoa que sobe as escadas com tanta desenvoltura, ou um editor, ou assim. Nas pregas das suas calças, o pó dos livros, mesmo que fosse só a senhora das limpezas. Gostava de me esconder na mala do seu carro, para vir cá todos os dias. É aqui, pensei eu. Já tinha ligado à recepcionista, quando andava à caça de quem me publicasse. Reconheço-lhe o timbre. Envie o original para a morada geral – repetia a voz cansada. Ela não me reconhece, mas eu sim. Agora já me trata pelo nome. Será que sabe como eu a odiei, naquele dia, ao telefone?
Chegámos ao andar, plink. Imaginava uma máquina de espremer escritores, dirigida por fatos sem rosto que os tentavam encaixar em quaisquer parâmetros correspondentes a valores abstractos deste mercado. Gráficos, betão, mesas muito longas com algumas cabecinhas a despontar nas pontas. Mas afinal não. Eram pessoas normais, com rosto, dois olhos e uma boca. Havia livros por todo o lado, pilhas deles, a cheirar a papel fresco. Era mesmo aqui. Podia esticar os dedos e estar tão perto do que queria ser.
Foi nesse dia, há mais de dois anos, que me trataram, pela primeira vez, como autora. E não como “uma miúda qualquer que gostaria de escrever livros”. Os comentários deixaram a base do “muita giro/chato” “gosto/não gosto”. Agora, podia ser a sério.

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