Com o risco assumido de que vou fazer um comentário
provinciano, preciso de admitir que o conceito de moda em Portugal chega sempre
um pouco desmembrado, relativamente ao resto do mundo. Quando, em certos
países, como em França, a moda é um conceito bastante plástico que dá azo a
várias derivações criativas; noutros países da Europa, como na Holanda, toda a
gente se está mais ou menos nas tintas para o assunto; em Portugal, assistimos
sempre ao mesmo conformismo, dentro do qual são introduzidos ocasionalmente
elementos soltos, progressivamente adaptados por toda a população sem grandes
variantes.
Estou a falar, por exemplo, dos saltos enormes de stiletto,
que já apareceram há algum tempo, mas que só agora me aprouve referir. (Sei que houve uma altura em
que o meu comentário seria muito mais actual mas que se lixe, é o meu blogue.)
Adiante.
Hoje em dia, nos passeios acidentados de Lisboa, assistimos
a pobres elementos do sexo feminino que se tentam içar, tais cabritas montesas,
pelas sete colinas acima. Ou saltam dolorosamente, como aranhiços em sofrimento,
de pernas dobradas perante a anti-naturalidade do seu desequilíbrio, julgando
que estão a protagonizar a maior das elegâncias.
Mas não estão.
Se há algum efeito, geralmente causado, é o da pena.
Para quê sofrer dessa maneira? E sobretudo: para agradar a
quem? A si mesmas não é de certeza.
Por uma questão de principio e de conforto, deixei os saltos.
Não tenho nada contra quem os use, impor escolhas aos outros não é o meu género,
mas nada me impede de reflectir sobre a problemática... Que seca ter de usar
aquilo!
Era, para mim, o mesmo que obrigarem-me a bater com uma
panela várias vezes por dia na cara, sob o pretexto de eu parecer sexy a fazer
isso.
Ora, afinal, não quero ser sexy nem agradar a um conceito de
estética que me é imposto arbitrariamente. É bem mais divertido assim.
O que temos aqui, com os stillettos, é o conceito do il
fault souffrir pour être belle levado ao extremo da catástofe: é que, neste
caso, “souffrir” implica coisas tão potencialmente dramáticas como deslocar o
tornozelo ou bater com os dentes no passeio. Meninas, por isso, se querem estar
na moda, é melhor mesmo ter o Inem em tecla rápida no vosso iphone
mega-ultra-tripla-tec-nec-super.
(O quê, ainda não têm um iphone
mega-ultra-tripla-tec-nec-super?)
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