domingo, 28 de outubro de 2012

"Detesto Lobo Antunes, Saramago ainda é pior"


Sendo aquilo a que se pode chamar, correndo o risco de cair no cliché, uma “amante da literatura”, desde sempre me confrontei com uma prática muito comum ao nosso povo, no que trata ao assunto dos grandes autores portugueses. É aquela mania (chamo-lhe mania, porque realmente não encontro palavra melhor) de dizer compulsivamente mal de dois, que, acaso ou não, contam entre os maiores nomes da literatura mundial contemporânea.
E são sempre os mesmos, esses dois.

Pior é quando, ao questionar em espanto o porquê, nos damos conta das razões, que frequentemente são:
- “É arrogante” (Acho este argumento realmente válido, porque todos sabemos até que ponto a qualidade literária de um texto está directamente dependente das apetências sociais do seu autor, aliás, Eça de Queiroz ficou conhecido para a História pela sua extraordinária capacidade de contar anedotas em bailes.)
- “Tornou-se muito comercial” (Cuidado, quando começarem a vender, isso quer dizer automaticamente que deixaram de escrever bem, ainda não foi explicado cientificamente mas é um fenómeno que muita gente conhece.)
- “Diz mal de Portugal” (Porque são perigosas e devem ser silenciadas, essas vozes subversivas anti-regime.)
- “Diz mal de Deus” (Enfim.)
- “Não se percebe nada” (Porque se eu não percebo o que está escrito, isso não tem nada a ver com uma falha nas minhas capacidades, é o texto que é uma porcaria. É o mesmo com os electrodomésticos: se não funcionam, é porque estão mal feitos e não porque eu não me dei ao trabalho de tentar perceber o manual de instruções.)

É um assunto irritante, mas, para a maioria, bastante aturável, penso eu.

No entanto, desde que comecei a dar cursos de escrita criativa, que o confronto com este problema se acentuou. “Merda, não posso dar este exemplo porque há muitas pessoas que não gostam do Saramago” – é um pensamento que, infelizmente, me é recorrente. Mas que ignoro. E dou o exemplo à mesma, porque a boa literatura é boa e temos todos de viver com isso.

Atenção, não que eu ache que toda a gente que gosta de livros tenha de ter estes dois autores na sua estante. Há que fazer a distinção. Que se ache um estilo ultrapassado, que se diga que um dado autor produziu mais do mesmo ou estendeu uma fórmula repetida em várias obras, são exemplos de argumentos literários. Argumentos literários, quando bem fundamentados, para contestar a qualidade de um autor, parecem-me válidos.

Argumentos pessoais, sobretudo quando provêm de fenómenos de manada, não.

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