quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Tentando comprar maçãs

Há quem goste de preencher os seus tempos livres com actividades físicas estimulantes. Estou de acordo. Passar a semana inteira sentado num escritório pode ser deveras entediante, e a inércia, como todos sabemos, não é saudável, e faz mal ao colesterol. Assim sendo, chegando-se ao fim-de-semana, uma boa maneira de desentorpecer os músculos e combater a inacção é fazer jogging no parque, montar a cavalo, ou até mesmo surf. Eu, por outro lado, prefiro passar o meu tempo nas caixas rápidas do supermercado Pão de Açúcar.
Com efeito, cada vez que terminei grande parte do trabalho para a semana, percebo que se escasseiam as desculpas para sobreviver à base de Mc Donals, Pizza Huts; e outras coisas que vão contribuindo para que daqui a uns anos as minhas veias se pareçam, de tão entupidas, com uma manhã no IC19. E assim sendo, decidindo que está na hora de começar a ingerir alimentos saudáveis, vou ao Pão de Açúcar, onde existem estas magnificas caixas rápidas (parece que também as há no Continente, só que essas para mim já ficam um pouco fora de mão). Entre mim e as caixas-rápidas-self-service-faça-você-mesmo deste supermercado já existe todo um historial, que remonta a largos anos. Mas prometo ser breve.
Acontece que, dando de caras com o facto de todas as outras estarem ocupadas com filas de 20 metros, é inevitável que nos lancemos nesta magnifica aventura, que promete “ser super prática, e fazer-nos poupar imenso tempo”. É mentira.
Primeiro, porque mesmo que à nossa frente apenas estejam 4 ou 5 pessoas, o que cria assim a ilusão de que nos vamos despachar relativamente cedo, é com grande desagrado que constatamos, ao aproximar-nos, que na verdade apenas existem duas caixas a funcionar, e as dez restantes estão fora de serviço devido a “problemas técnicos”. Depois, percebemos que nos cabe esperar um bom bocado porque à nossa frente estão muitas pessoas de idade (ninguém mandou vir fazer compras a um feriado de manhã), que demoram a compreender como funcionam estes novos métodos. É frequente vê-las semi-cerrar os olhos, esbracejando, confusas, à frente do ecrã, à medida que vão lentamente passando os produtos pelo sensor. Não seria assim tão mau, se não tivessem decidido comprar meio supermercado.
Quando, meia hora depois, alguma caixa se liberta, embirramos com a pessoa à nossa frente, porque olha para o boneco em vez de perceber que já podia avançar. Tocamos-lhe ao de leve no ombro, dizemos “olhe” com um ar enjoado, e suspiramos muito, resmungando baixinho “andam a dormir”. No entanto, quando chega a nossa vez, constatamos com desespero que o nosso campo de visão não nos permite ver que caixa fica livre nem quando, o que faz com que andemos de um lado para o outro, muito aflitos, de pescoço esticado, a tentar perceber se já podemos avançar. Nessa altura, não é raro termos já alguém atrás de nós a tocar-nos ao de leve no ombro, e a dizer “olhe”.
Chegou finalmente a nossa vez, e caminhamos, apressada e entusiasticamente, para o lugar. Mas é aqui que surgem questões e dúvidas existenciais que nunca dantes se nos tinham posto na vida. Contemplando abismados o ecrã, percebemos que não fazemos na realidade a mínima ideia se o que temos à nossa frente são “maçãs fuji”, “maçãs golden”, ou “maçãs golden vida Auchan”.


E as peras que escolhemos, serão “pêra william’s ou “pêra rocha do oeste”? Quando achávamos que as coisas não podiam piorar, eis que os produtos não passam no scanner; e, finalmente, a máquina começa a emitir mensagens sem sentido, e a apitar altíssimo. Carregamos, em pânico, no botãozinho que chama a senhora. Começamos a sentir uma grande pressão, e olhares matadores atrás de nós.
Quando a assistente finalmente chega, diz-nos, ao fim de uma breve análise, que não há nada a fazer. A nossa caixa deixou simplesmente de funcionar, devido a problemas técnicos. Face a isto, resta-nos, se ainda o quisermos, esperar mais 20 horas numa das outras. E assim se passa um magnífico feriado.

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