terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A conversa da crise


Hão-de reparar que, hoje em dia, quem mais se refere queixosamente ao vago termo de “crise” é quem menos faz para que as coisas se resolvam. Não que o cidadão comum, no geral, possa fazer muito, é verdade. Quem não tem mais influência ou disponibilidade pode ir às manifs, derrubar umas cancelas, mandar uns petardos e tal. Estou-me, no entanto, a referir às pessoas que rigorosamente nada fazem, simplesmente passando o dia de cu sentado em casa, mas que mesmo assim não se calam com chavões como “isto está mesmo mal” – que já ninguém suporta.
Sim, já todos percebemos que isto está muito mal e agora? Em vez disso, poderiam apresentar soluções práticas. Que se diga mal do governo, das medidas por ele tomadas, da corrupção generalizada do nosso sistema, do sistema bipartidário que já não funciona, da perversidade dos aparelhos partidários, da falta de transparência da nossa democracia; acho óptimo. Vamos falar sobre isso. Adoro falar sobre isso. Agora para vagos queixumes sobre o “como isto está” já não tenho paciência e já não posso ouvir.
 
Devia haver uma multa para as pessoas que andam para aí a dizer “como isto está”, mas essa não seria paga em dinheiro. O cidadão seria, sim, obrigado a ler todos os jornais que lhe pudessem à frente durante uma semana (coisa, provavelmente, nova na sua vida – por alguma razão se fica por apreciações vagas e nunca chega a criticas concretas) finda a qual deveria passar duas horas a debater, com outro cidadão apanhado no mesmo ilícito, soluções práticas e medidas que gostaria de ver tomadas. Assim, sim.
Mas eu acho que essas pessoas, no fundo, gostam de ser assim. É a conversinha que temos com o senhor do café, é o debafo que se faz à vizinha, mas em relação ao qual não se sente um mínimo de ligação, sim, gostamos disso. Porque é muito mais cómodo mandar bitaites para o ar do que interessar-se, de facto, pelas coisas. Porque é muito mais cómodo ver a novela do que ler, de facto, o jornal. E quem é responsável pelo ponto a que chegámos adora a conversa do “como isto está”. Porque revela aquele fatalismo apassivante que tão bem nos caracteriza e graças ao qual nos deixamos embrutecer e manipular até agora nos termos lixado a sério. 

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