Tendo sido formadora na área da escrita criativa há algum
tempo, uma das coisas que me choca mais é
a quantidade de aspirantes a escritores que não lêem, nem gostam de ler,
nem tencionam nunca fazê-lo. Digo isto sem qualquer tipo de pretensão de me
achar melhor do que os outros, tenho noção de que estou em início de carreira
(como é óbvio, tenho, eu também, muito para aprender, ler etc.) apenas me choca
que alguém que me diga, por exemplo, que está a começar a escrever um livro,
esclareça ao fim de alguns minutos de conversa que “pois mas eu não tenho tempo
para ler”.
Então e tempo para escrever um livro, já tem?
Podem achar que estou a ser demasiado radical, podem dizer
que há pessoas que se inscrevem em cursos de escrita simplesmente por pura
diversão, sem qualquer tipo de ambições literárias de extrema exigência. Eu
aceito e acho que sim, podemos fazer disto um hobbie, não há mal nenhum, antes
pelo contrário. Em termos de passatempo lúdico, parece-me até bastante
interessante e saudável. Não é, no entanto, o caso de muita gente que,
tencionando de facto publicar alguma coisa (alguns mostrando motivações
bastante aguerridas e orgulho extremo no seu trabalho) se recusa a estudar o
que foi publicado anteriormente, como se pudesse simplesmente inventar o estilo,
aprendendo do zero. Ora – grande novidade – isso não é possível.
Diria mesmo que é incompreensível: se eu não gosto de ler e
vou produzir um texto literário, então isso não quererá dizer que eu não vou
gostar sequer de me ler a mim mesmo? A menos que vá ao ponto de admitir que
apenas a minha própria produção me é aceitável, negando assim todas as outras.
Mas nesse caso eu não deveria partir do princípio que os outros estejam
interessados no meu material, pois este é produto exclusivo do meu próprio ego
e como tal, apenas me vai interessar a mim e eventualmente aos meus amigos.
Isto deveria ser uma coisa óbvia, mas importa esclarecer, só
para que fique dito: nunca se consegue criar algo de novo sem aprender com os
mestres, ver o que está para trás e assimilar os paradigmas. Uma das tarefas
mais difíceis em literatura é ganhar visão objectiva do nosso próprio trabalho
e distanciarmo-nos ao máximo do envolvimento emocional que criamos com a
linguagem e com a forma. Sem nos conseguirmos situar no panorama literário, não
há absolutamente maneira nenhuma de isso acontecer.
Disseste tudo. Muita gente devia ler esta mensagem, que pode perfeitamente ser adaptada a outras áreas, como a música, a dança ou a pintura. Infelizmente, o ser humano é muito pretensioso.
ResponderEliminarBeijinho*
Ana :)